'Que o 7 de setembro não seja usado para fazer campanha ou promover divisionismo', diz Ayres Britto – AASP
Uma longa, apaixonada e consistente defesa da democracia foi o principal tema da palestra do jurista, professor e ex-presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), Carlos Ayres Britto, na manhã deste sábado (27) em Campos do Jordão, no 13º Encontro Anual AASP (Associação dos Advogados de São Paulo).
Ayres Britto foi um dos participantes do painel ‘Constituição e tecnologia’, do 7º Colóquio sobre o Supremo Tribunal Federal, ao lado da advogada Ana Frazão, professora de Direito Civil, Comercial e Econômico da UnB (Universidade de Brasília). O evento é realizado com apoio de OVALE, que faz uma cobertura especial durante os três dias do encontro na Serra da Mantiqueira.
Em conversa exclusiva com OVALE, o ex-presidente do STF comentou sobre os eventos do próximo 7 de setembro, data comemorativa do país que vem sendo apropriada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), que convocou seus apoiadores a ir às ruas “‘pela última vez”, sem dar detalhes do motivo da convocação.
“Que o 7 de setembro seja consagrado ao que sempre foi, a exaltar a independência do Brasil, não para fazer campanha eleitoral ou promover divisionismo, sectarismos, dissensos predatórios quanto à unidade do país”, disse Ayres Britto.
Sobre o momento de polarização que o país enfrenta, com clima de tensão entre os três poderes e ameaças golpistas, o jurista disse que os poderes “devem se lembrar de que, pela Constituição, devem atuar de forma independente, porém harmoniosa”.
“É uma forma conciliada de atuação. Agora, não se pode sacrificar a independência. Eventualmente, a harmonia pode ficar um pouco tensionada, friccionada. Mas é inconcebível afastar a independência, cada um no seu quadrado normativo, com altivez e com toda a responsabilidade.”
Ayres Britto também falou sobre o ministro do STF e presidente do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Alexandre de Moraes, principal alvo dos ataques bolsonaristas.
“Em linhas gerais, ele é bom aplicador da Constituição, um constitucionalista, intérprete e aplicador da Constituição. O que se tem chamado de ativismo eu chamo de proatividade interpretativa, no sentido de imprimir à Constituição todos os ganhos possíveis de funcionalidade.”
E completou: “A Constituição é para valer, é a lei das leis, basta lembrar que é a única lei que não tem número. A lei que o Estado não faz e quem a fez foi a nação para o Estado, se chama Constituição”.
DEMOCRACIA
Em sua palestra, o ex-presidente do STF falou sobre a importância fundamental da democracia para o país, que vive uma crise política com ataques constantes ao estado democrático de direito.
“Qual o primeiro princípio? O princípio dos princípios. Que mais se faz presente nos outros princípios. Que baliza todos os outros. Que princípio que é fonte, é imã e bússola tudo ao mesmo tempo”, perguntou Ayres Britto à plateia.
“Quando a imunidade parlamentar e a liberdade de expressão atacam a democracia, a democracia morre assassinada e a liberdade de expressão e a imunidade parlamentar morrem por suicídio. Só existe liberdade de imprensa e imunidade parlamentar com democracia”, disse o jurista, que foi aplaudido de pé.
Sem mencionar diretamente os ataques de Bolsonaro e seus apoiadores fazem ao STF, Ayres Britto reforçou o papel do Judiciário.
“Muitas vezes o Judiciário é acusado de invadir competências constitucionais, mas quando analiso eu vejo o Judiciário como proativo. O Judiciário entende da parte jurídica, isso não cabe ao Executivo e ao Legislativo.”
O jurista disse ainda que quem entende de direito não é quem o aplica, mas é o sistema de justiça.
“Judiciário não, é necessário ter entendimento de direito. Quem entende de direito não é quem o aplica, mas o sistema de justiça. Não é superior ao Estado, é anterior ao Estado, tem vínculo com o povo. o Estado tem vínculo com a Constituição, advém da nação, mas se constrói por medidas constitucionais”, afirmou Ayres Britto.
PRESIDENTE
O jurista também disse que o presidente da República precisa “manter, cumprir e defender a Constituição. Está eleito pra cumpri-la dessa forma, e aquele que atentar contra ela, impeachment nele, é assim que funciona”.
“A nação funda o direito de um povo que tem o nome de Constituição. Temos muitas pessoas estatais, mas uma só nação. Não existe na Constituição a palavra nação, já que quem entra nela é o Estado, já que ele é nomeante e nomeado. Corrente, nascente e foz, igual um rio, assim é o direito constitucional. Só nós sabemos isso, isso é nosso dia a dia, nós vivemos isso. A Constituição é nossa bíblia jurídica, é nosso norte. Nós nos perguntamos isso, o Legislativo e o Executivo não”, disse Ayres Britto.
Por fim, o jurista lembrou que a Constituição abre com dois princípios fundamentais, que “fundam e criam a fisionomia jurídica do país”.
“O primeiro princípio é democracia: aquela que é fonte, imã e bússola. O principal deles. Constituição é a única lei que o Estado não faz. Forças Armadas, Legislativo, direito a voto, liberdade de expressão, de imprensa, de iniciativa, tudo isso é fruto da constituição.”
Veja aqui a entrevista de Ayres Britto
Source: AASP